

O homem de sete instrumentos
Prestou relevantes serviços ao Amazonas, notadamente no período áureo da economia da borracha, mas também em tempos depois desse apogeu, um paraense – Arthur César Moreira de Araújo – que fez carreira no magistério, no campo militar, na engenharia, na empresa privada e na política, daqueles que se pode dizer que tocava sete instrumentos, e todos eles com qualidade.
Engenheiro militar, a ele foi acometido atuar nas obras finais de construção do Teatro Amazonas, ser fiscal das obras do Porto Flutuante de Manaus, autor do projeto de construção e arruamento da Vila Municipal, atual bairro de Adrianópolis; autor do projeto de construção do Cassino Julieta, depois Cineteatro Guarany, integrar a equipe de estudos das obras de esgotos sanitários em Manaus, por exemplo.
Como professor, lecionou Geometria Analítica, Cálculo Diferencial e Integral na Faculdade de Engenharia; Álgebra Superior e Geometria Analítica na Faculdade Militar e Curso de Agrimensura; Mecânica e Astronomia, na Faculdade de Ciências e Letras, membro da Comissão Científica e Diretor da Faculdade de Engenharia e Presidente das bancas de exames de Ciências e Letras e Agrimensura, e desempenhou o importante cargo de diretor-geral, tudo na Universidade de Manáos. Além disso, foi professor catedrático de Matemática e Astronomia do Ginásio Amazonense Pedro II, mediante concurso; diretor do mesmo Ginásio; professor de Matemática e diretor da Escola Técnica de Comércio “Solon de Lucena”.
Como militar, formado na Escola de Realengo, no Rio de Janeiro, serviu em Belém e Manaus, e foi comandante Batalhão de Polícia do Amazonas, sempre inspirado por Benjamin Constant, e com larga compreensão do positivismo.
Na política, foi Superintendente Municipal de Manaus (1898-1902), denominação que era conferida ao cargo de Prefeito, como homem de confiança de outro positivista, o governador Fileto Pires Ferreira, mantido por José Cardoso Ramalho Júnior, desenvolvendo forte atuação em educação, urbanismo, sanitarismo, inclusive com a inauguração do cemitério de São João Baptista, que era uma necessidade premente na época.
No campo da iniciativa privada, foi sócio da empresa Telefônica de Manaus ao lado de Lourival Alves Muniz e José Avelino Cardoso, adquirida em transferência do dentista Heliodoro Jeramilo, em condições comerciais e de funcionamento bastante precárias. Os novos proprietários reanimaram a empresa com nova dimensão e valorização empresarial, ainda que com aporte do Estado, feito em libras esterlinas.
Poliglota, com fluência especialmente em inglês, francês e alemão, integrou a Sociedade Astronômica de França.
Casou-se com Donolina Nogueira Fleury, tendo os filhos César e Lúcia. César foi médico e Lúcia contraiu núpcias com o Dr. Augusto César Lopes Gonçalves, advogado e político com atuação em Manaus e no Rio de Janeiro. Faleceu no Rio de Janeiro em 22 de julho de 1935.
O que resta em sua memória e homenagem a essa grande contribuição ao desenvolvimento do Amazonas é uma modesta Escola pública estadual, embora mereça todas as honras de quem atuou em várias frentes de trabalho, com denodo e honradez.


Além dos microfones
Quando foram estabelecidas as emissoras de rádio no País, era comum dizer-se que os jornais impressos haveriam de padecer e perder o protagonismo, precisamente pela rapidez com que essas novas mídias fariam chegar as últimas notícias ao conhecimento do grande público. Depois, a elas foram incorporadas a radionovela, a transmissão dos jogos de futebol, os programas de auditório e os de animação e sorteios, os de recados para o interior, os de música e, mais adiante, os de orações e pregações religiosas. Esses veículos de comunicação dominaram e ainda têm enorme influência nas relações sociais, comerciais e políticas da sociedade atual.
Nesse campo, Brasil afora, surgiram os grandes comunicadores, nomes que se tornaram ícones da radiofonia, verdadeiramente emblemáticos, e que, também por isso, se projetaram em outros campos de atuação, especialmente na política. Alguns destes, entretanto, possuíam e possuem formação ainda mais apurada e qualificada em outras áreas de estudo e de trabalho, das quais nunca se afastaram, conciliando com a atividade de comunicação social. Não raro, atendem a uma paixão, herança ou tradição.
Na história da radiofonia amazonense, resultado de paixão, tradição e herança, há um destacado profissional da comunicação, administrador de empresa, festejado homem público que já exerceu inúmeras e relevantes funções de governo e eletivas, nas quais sempre atuou com entusiasmo, idealismo e competência, além de elevado espírito público.
De timbre de voz inconfundível, linguagem própria e ritmo contagiante no falar radiofônico, fez com que a cidade inteira se acostumasse a despertar com sua alegria – na música e na voz -, e usou frases que se tornaram célebres como “bom dia dona Maria”, “olha a hora dona Aurora”, “em cima do prato e debaixo da agulha”, “Difusora, o amor do Amazonas” as quais eram capazes de conduzir a manhã de todos os dias em especial as de domingo, mandando recados para os amigos das feiras e mercados, anunciando a posição das águas do Rio Negro ou informando as previsões do tempo e as suas conclusões a respeito do resultado das eleições, sempre que elas se processavam em Manaus, sem temer as borrascas dos poderosos.
Desportista, administrador, político, homem altivo, divertido, brincalhão, dinâmico, esse gênio da comunicação tem nome, raça e “pedigree”, compõe uma bela página na história política, social e econômica do Amazonas e é capaz de reunir amigos durante dezena de anos em derredor de uma boa conversa e muitas rodadas de dominó e, ao mesmo tempo, ser presidente do Poder Legislativo de Manaus e do Estado, assumir a tribuna parlamentar com veemência e sagacidade, ser secretário de Estado da Educação, Ouvidor Geral do Estado, conselheiro e presidente do Tribunal de Contas do Estado, sempre sem pose sofisticada, sem a majestade que muitos costumam demonstrar, mas atuando com critério ético, honra e dignidade. Portanto, muito além dos microfones.
Ademais, e como prova do enorme apreço que os amazonenses têm por ele, em todas as eleições que disputou foi campeão de votos, portanto, detentor do legítimo aplauso popular que pode ser conferido ao político, e campeão de audiência no seu programa de rádio, privilégio de poucos e tradução do reconhecimento dos ouvintes.
Por tudo isso, Josué Claudio de Souza Filho está no coração do povo amazonense.


Arnaldo: Supercampeão
Depois do forte impacto sofrido em razão da notícia que me chegou por telefone, informando que o desenlace se dera há poucos minutos, emocionado e triste me recolhi em orações contritas em agradecimento pela nobre passagem terrena do amigo e profissional de alto quilate que tive o privilégio de conhecer: Arnaldo dos Santos Andrade.
Durante alguns dias tentei escrever em sua homenagem para publicação neste canto de página que ele fazia questão de ler semanalmente e, quase sempre, tecer comentários elogiosos, animadores e saudosistas. Era generoso!
Nossa amizade vinha de antes de nós. Decorria da relação fraterna entre nossos pais – Lourenço Braga e Francisco Caetano de Andrade – que atuaram juntos na política partidária, eleitoral e sindical do começo dos anos 1930, na defesa dos direitos dos trabalhadores, quando compuseram os quadros do Partido Trabalhista Amazonense -PTA. De lá em diante, todos nós, de lado a lado, seguimos amigos e caminhamos nem sempre juntos, mas nunca apartados dos valores que os pais nos legaram. Foi bom filho e pai extremado!
Tenho presente o dia em que foi convidá-lo, em nome do governador Amazonino Mendes, para dirigir a área de Esportes do governo estadual e, aberto a desafios, mas atento aos compromissos assumidos, honrado com o convite, mas preso ao trabalho que vinha realizando na empresa privada, preferiu debater com seus superiores para, só depois, aquiescer ao chamamento que lhe fora feito para mais uma vez servir ao desporto amazonense. Seu trabalho ganhou destaque imediato. Era competente!
Pouco depois, reformulada a estrutura da Administração, o Esporte foi incorporado à Secretaria de Cultura e Estudos Amazônicos e para nossa alegria – dele e minha, bem sei – fomos trabalhar lado a lado na construção dessa relação (cultura e esporte e esporte como cultura social), a partir de seminários e debates sérios e profundos com técnicos e especialistas e, mais uma vez, ele se destacou pela clareza das apreciações, pela pertinência de suas abordagens. Foi uma demonstração de grandeza de sua parte, integrar uma equipe jovem que sonhava alto. E ele sonhou junto e construiu conosco os primeiros desenhos do sonho que se realizou por 21 anos. Era idealista!
Com ele, e por iniciativa dele, dentre inúmeras realizações, pode-se referir a regata Cambridge-Brasil-Oxford nas águas do rio Negro, com uma organização impecável, a merecer elogios de quantos acompanharam a iniciativa ou dela participaram. Era perfeccionista!
Muito mais tarde, fui encontrá-lo no comando do grande campeonato do Peladão, inovando, construindo e reconstruindo ideias que ampliassem ainda mais essa competição criada por Umberto Calderaro e que permanece com sucesso, passados 50 anos. O “Peladão” de agora tem o toque de sua genialidade e a gestão operosa e dedicada da família de “A Crítica”, liderada por Cristina Calderaro Corrêa e Dissica Calderaro Thomaz, exemplo bem-sucedido de empresa familiar que permanece progredindo. Era inovador!
Nosso último encontro foi de abraços, sorrisos largos, conversa franca, como sempre sucedia, dessa feita no corredor do Teatro Amazonas, após um belo espetáculo de balé. Disse-lhe do livro que publicara contando as histórias do PTA e dos nossos velhos comandantes – Lourenço e “seo” Caetano –, mas sei que ele não chegou a ler como era de seu ardente desejo. Na ocasião, deu-se o abraço fraterno que repetia inúmeros outros que ele e meus irmãos João e José confraternizaram em diversas empreitadas e dos quais sempre ouvi considerações de respeito e elevada admiração em relação ao desportista e ao cidadão Arnaldo Santos. Era bom amigo!
Há um vácuo no Amazonas, desde que ele caminhou para novas responsabilidades e encargos em outros campos da eternidade, passado o tempo do desligamento da matéria. Afinal, Arnaldo foi craque na vida.


Dever de correção
Ainda findava o ano de 2024 quando constatei, de bom grado, que o prédio sede da ESAT- Escolar de Artes e Turismo da Universidade do Estado do Amazonas, na Rua do Leonardo Malcher com Rua do Major Gabriel, de cuja unidade de ensino fui o primeiro diretor aquando da criação e instalação da UEA, teve a sua apresentação exterior inteiramente reformada, com obras e serviços de engenharia de conservação que, de há muito, se faziam necessárias.
Edifício que pertenceu à EMBRATEL – Empresa Brasileira de Telecomunicações durante vários anos, muito bem construído, foi o primeiro prédio adquirido pelo governo do Estado para a Universidade, logo nos primeiros tempos em que o governador Amazonino Mendes criou a instituição e conferiu ao professor Lourenço Braga a incumbência de torná-la realidade, desde o primeiro ato e após uma reunião informal em sua residência em uma manhã de sábado.
Escolhido pelas condições físicas ideais que oferecia, localização, acessibilidade e, principalmente, custo de aquisição, quando identificado, o prédio foi visitado por grupo de assessores do governador e pelo reitor os quais, de logo, verificaram que a edificação preenchia as condições exigidas para a ocasião, pois era capaz de acolher vários serviços, inclusive a biblioteca central, os cursos de artes e de turismo e até mesmo o de Direito e o de mestrado em Direito Ambiental, como sucedeu pouco depois.
Resolvida a questão documental, com todo o critério justo e legal necessários, o reitor expediu portaria dando o nome do professor Samuel Benchimol à primeira unidade da nova Universidade, em justo reconhecimento à expressiva – expressiva e qualificada – contribuição que o ilustre mestre prestou ao ensino, às artes, às letras, à economia do Amazonas, e à Amazônia, razão pela qual mereceu o destaque honroso.
Para tornar a decisão devidamente conhecida do grande público, não só dos universitários, professores e servidores da Casa, o reitor mandou inscrever, na placa de inauguração e em totem disposto na via pública, o nome do professor Samuel Benchimol em letras visíveis, de modo que a sociedade amazonense tomasse conhecimento que a Universidade reconhecia, logo nos seus primórdios, o papel de educador e amazonólogo.
Para minha surpresa, as recentes obras de recuperação das fachadas do prédio que se faziam necessárias como disse acima – resultaram em suprimir do totem da via pública o nome do ilustre professor, preferindo indicar que se trata, unicamente, da sede da Escola de Artes e Turismo da Universidade do Estado do Amazonas.
Lamentável omissão e desconhecimento da importância que o mestre teve na educação superior amazonense, na projeção do Estado no campo das letras, da pesquisa documental na Europa sobre a Amazônia, das artes como incentivador de criadores culturais e como cidadão cônscio de sues deveres com o País e a sociedade. Por isso, é urgente que a Universidade adote providências para recompor a placa e fazer incluir o digito seguinte: Edifício Professor Samuel Benchimol, por ser da mais lídima justiça, por ser dever de correção e para impedir o apagamento da memória universitária.


Crime Tropical
Não é comum que utilize esse espaço domingueiro para tratar de assuntos do cotidiano atual da cidade, salvo quando o tema tem realce desmedido e pode trazer consequências irreparáveis para os verdadeiros e legítimos interesses coletivos, como é o caso de hoje.


Robério Braga, O dia da renúncia
O fogo que dominou todo o edifício de mais de duzentos anos avançou sobre a memória do País e de todos os brasileiros, e, em pouco tempo, transformou em cinzas o trabalho centenário de pesquisadores, doutores, operadores da arte e das culturas, de várias outras nações, das nossas origens e da formação da nacionalidade"


Desastre anunciado
O fogo que dominou todo o edifício de mais de duzentos anos avançou sobre a memória do País e de todos os brasileiros, e, em pouco tempo, transformou em cinzas o trabalho centenário de pesquisadores, doutores, operadores da arte e das culturas, de várias outras nações, das nossas origens e da formação da nacionalidade"


As cinzas amazonenses
Sofrendo com as incomensuráveis perdas provocadas pelo desastroso incêndio que consumiu praticamente vinte milhões de peças do Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, cujas causas imediatas, além da incúria de governantes federais, do descaso de empresários desinteressados na cultura nacional e desleixo de alguns administradores da instituição, só poderão ser examinadas com clareza após o rescaldo e as perícias necessárias, se é que conseguiremos saber e que confiaremos nos resultados apresentados.


Iniciativa invertida
“O caso presente, entretanto, parece estar às avessas porque a medida adotada em âmbito federal foi no sentido de submeter a política de cultura à de turismo e tratar a cultura como emprego e renda, ou seja, pelo ângulo econômico.


Revivendo a honraria renascida
“Não sei, mastinhaasensação, agora revista quando o olhar se põe sobre o passado,queelesaspiravamquefosseumeloaajudar a construir o novo raiardaAcademia.”